quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Dialecto



usávamos um dialecto próprio porque não queríamos que as vozes do passado nos raspassem os blocos de notas com as suas recomendações de tecido gasto
usámos o verniz da língua para pintar a nossa música
e assim avançámos em direcção ao lodo do nosso destino
irrompemos pelas artérias do crime porque
todos os demónios do futuro tinham o telemóvel desligado
procurámos uma vingança madura que nos pudesse satisfazer as necessidades mais básicas,
uma vingança sumarenta que nos apelidasse o tédio
usámos um dialecto próprio de roupa luminosa e bonés fúnebres
saímos e fomos beber uma crise com mais polpa, uma crise mais moderna
saímos para ir ter com uma crise mais cosmopolita e europeia
caminhámos durante horas em direcção à linguagem
e a linguagem desfez-se como papel molhado, e molhámos a linguagem e decidimos que para a próxima trazíamos umas facas
umas facas capazes de dissecar melhor a linguagem
e voltámos a tentar os demónios do futuro que já não tinham os telemóveis desligados e os demónios disseram é a crise e os demónios disseram
uma verdade por coração, cada coração por um tostão
as vertigens verteram para as verrugas das nossas bebidas
e as palavras cresceram ásperas
na música explodida por dentro dos ouvidos.
e os rostos são todos brisas salgadas, sem distinção
e o calão rude que utilizamos possui toda a beleza cristalina da aragem suave do teu offshore na Suíça
e por vezes as metáforas pontiagudas aglomeram-se nas frechas da pele
como quando te apontei aquela faca e te pedi que passasses para cá
toda a destruição que me pertence.